sexta-feira, 16 de agosto de 2013

UM VIOLINO NO TELHADO (1971)

PONTUAÇÃO: MUITO BOM
★★★★★
Título Original: Fiddler on the Roof
Realização: Norman Jewison
Principais Actores: Topol, Norma Crane, Leonard Frey, Molly Picon, Paul Mann, Rosalind Harris, Michele Marsh, Neva Small, Paul Michael Glaser

Crítica:

UM JUDEU NO TELHADO

I know, I know. We are Your chosen people.
But, once in a while, can't You choose someone else?

Cantam os primeiros pássaros da manhã e o esplendor da aurora abraça os campos da Rússia czarista, no principiar do século XX. Fiddler on the Roof trata de desmontar a metáfora do seu título, assim que o sol nasce. A imagem é por demais poética e servirá na perfeição os intuitos do musical, mas o tema nuclear é a tradição e o quão difícil é, por vezes, equilibrar a vida perante as adversidades, mediando o conservadorismo e os velhos valores com as ideias e os costumes dos novos tempos, sem perder a identidade do povo do qual se faz parte.

Here, in our little village of Anatevka, you might say every one of us is a fiddler on the roof trying to scratch out a pleasant, simple tune without breaking his neck. It isn't easy. You may ask 'Why do we stay up there if it's so dangerous?' Well, we stay because Anatevka is our home. And how do we keep our balance? That I can tell you in one word: tradition! (...) Traditions, traditions. Without our traditions, our lives would be as shaky as... as... as a fiddler on the roof! 
Tevye

Tevye (entrega absoluta e genuína, empática e memorável de Topol, no papel de uma vida) é um leiteiro pobre - judeu como todos quantos habitam a pequena e pacata comunidade local. Tem ao seu lado uma mulher de fibra, que mais parece ser o homem da casa, e cinco filhas solteiras, três delas em idade de casar. Após a contextualização - o hino e a glorificação da tradição, cultura e religião judaica em que consistem as primeiras e contagiantes canções (temas de Jerry Bock e letras de Sheldon Harnick, adaptadas pelo mestre John Williams) e onde nos são apresentados os papéis sociais do papa (que trabalha e alimenta a família), da mama (dona de casa e mãe exemplar), dos filhos (formação religiosa), filhas (formação doméstica) e de personagens-tipo como a casamenteira, o pedinte ou o amado rabino, a acção centrar-se-á nos três pedidos de noivado às filhas mais velhas. 

A primeira filha escapa ao casamento arranjado com o velho e endinheirado carniceiro e casa-se por amor, com o franzino e desgraçado alfaiate, amigo de infância. A segunda, ainda antes de qualquer arranjo, perde-se de amores pelo marxista universitário recém-chegado à cidade, cujos ideais fazem tremer a sabedoria secular. E a terceira, igualmente em nome do amor, foge para casar com um gracioso e charmoso goy - um não-judeu. Pedido a pedido, Tevye, enquanto pai e patriarca, é confrontado com dilemas morais, que o levam a equacionar os prós e os contras de abençoar e permitir tais casamentos. É curiosa a forma como essas cenas são encenadas - Jewison distancia, magicamente, o protagonista do casal em questão e coloca-o a avaliar a situação em conversa aberta com Deus (conversas essas regulares ao longo de toda a obra, seja com Deus ou connosco, espectadores - Tevye é também o nosso guia pela história). Na balança, sempre a tradição, a família e aquilo que é ou não aceitável; no fim de contas, o bom-senso à luz dos tempos, o que é bastante revelador do carácter de Tevye. Na sua meia-idade, não é um fanático intolerante, antes é um homem bondoso e justo, que quer o melhor para os seus. No primeiro caso, even a poor tailor is entitled to some happiness! acaba por ressoar na sua consciência e por levar a melhor. É hilariante, a propósito, a forma que o leiteiro encontra para convencer a mulher de que o alfaiate e não o talhante é o melhor partido para a filha. No segundo caso, também a nova lei do amor acaba por vencer: 

He loves her. Love, it's a new style... On the other hand, our old ways were once new, weren't they?... On the other hand, they decided without parents, without a matchmaker!... On the other hand, did Adam and Eve have a matchmaker?... Well, yes, they did. And it seems these two have the same Matchmaker! 
Tevye

Seria de esperar, portanto, que perante o terceiro pedido de noivado a deliberação fosse favorável. Afinal, Tevye cede uma e outra vez. Mas o inesperado acontece - o pai jamais poderá aceitar o casamento da filha com um não-judeu. Isso iria contra tudo aquilo em que acredita, poria em causa a sua dignidade, a sua fé e toda a sua tradição. Chava insiste e casa com o enamorado, às escondidas, o que significa a tragédia e a ruína interior de Tevye e da sua família - a não-aceitação acarreta uma dor imensa e um afastamento definitivo da filha, que para ele é como se tivesse morrido. Nem sempre a felicidade está sobre a tradição, concluimos. 

How did this tradition get started? I'll tell you!
I don't know. But it's a tradition... and because of our traditions... 
Every one of us knows who he is and what God expects him to do. 
Tevye

No final, fugindo ao anti-semitismo, deixam-se os lares e parte-se novamente de encontro à Terra Prometida, seja ela onde for. We've been waiting all our lives for the Messiah. Wouldn't now be a good time for Him to come? Eis o destino de um povo, profundamente fiel às suas crenças e tradições.

Roger Ebert disse, a respeito: it's become so polished, so packaged (...) that it's become just another pleasant product of American entertainment industrialism*. Não deixo de concordar. Não obstante, é deslumbrante em cada enquadramento (inspirada fotografia de Oswald Morris), a câmera de Jewison passeia pela vila com a maior graciosidade, a banda sonora é magnífica, recheada de grandes canções, Topol magnetiza todas as atenções e apaixona-nos. Os cenários e decoração sustêm a verosimilhança do retrato e envolvemo-nos inteiramente na história, gozando do tão bem-humurado entretenimento das sequências musicais. Fiddler on the Roof é, pois, um caloroso clássico, não só no palco como no cinema, que merece ser apreciado geração após geração.

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